2 de março de 2060. Hoje faço 77 anos. Estou sozinho. Está chovendo. À minha frente um copo de whiskey 20 anos, um cinzeiro e meu velho cachimbo. Dou uma tragada e a fumaça me traz um gosto de palha de milho. Milho. Lembro que quando garoto gostava muito de pamonha. Quando o milho foi extinto, em 2037, guardei algumas pamonhas congeladas. Todas de sal, queijo e lingüiça apimentada. Sorte a minha as vacas terem sobrevivido até 2045. Hoje compro o melhor leite em pó que existe. Quase me recordo das vacas no pasto do meu avô, na beira do Rio Grande. Faz tempo que o rio grande virou mar. Hoje a praia fica há 207 km de Brasília, onde antigamente eram cachoeiras. Oxum e Iemanjá viraram um só orixá. Obaluaê não precisa mais se cobrir com as palhas. A costa está perto, mas as palhas são difíceis de achar. Sou um dos últimos sobreviventes. Tudo começou em 20/12/2012. Não gosto nem de lembrar. Ninguém sabe quem apertou o primeiro botão. O engraçado é que a mesma tecnologia que destruiu boa parte dos seres humanos, hoje é o que nos mantém vivos. Não sei quanto tempo de vida ainda me resta, talvez algumas horas, mas sei que vou aproveitá-las ao máximo. Que assim seja.